terça-feira, 3 de novembro de 2009

Turista em Porto Alegre

No último sábado do mês de outubro de 2009, o Meme se embrenhou pelas ruas do bairro Cidade Baixa como parte da pesquisa que está fazendo para o seu novo trabalho, Acessos, que terá estréia no próximo dia 19/11 na casa da Lopo Gonçalves, 176, dentro da programação do Festival de Dança Mesa Verde (www.festivalmesaverde.com.br).

A caminhada histórica, orientada pelo arquiteto Paulo Cesa, incluia a visita ao Museu de Porto Alegre Joaquim José Felizardo, antigo Solar Lopo Gonçalves, onde residia a familiaL opo Gonçalves, of course.
Para minha surpresa, em pleno sábado de feriado de finados, havia uma pequena multidão acompanhando o "city tour", que tinha a escolta de dois azuizinhos para ajudar aquele povo todo a atravessar a rua. O calor que vinha do sol e desprendia do asfalto dava a sensação de que poderíamos muito bem estar caminhando em direção às pirâmides do Egito! Mas não... Lá estávamos nós caminhando pela João Alfredo de câmera digital na mão e muitas novas imagens no olhar. Sim, porque não é todo dia que enxergamos a nossa cidade com olhos de turista, olhos que se dispõe a sair do olhar cotidiano e se permitem novas visões. É como estar um pouco do avesso, provoca um estranhamento gostoso, uma familiaridade que dá coceiras, remexe nas nossas pré-concepções de espaço /trajeto / ruas / caminhos.
Pela primeira vez, entrei no Pão dos Pobres (www.paodospobres.org.br), que surgiu em 1895 com o intuito de amparar viúvas e órfãos dos mais de 20.000 mortos dizimados pela Revolução Federalista, uma guerra entre gaúchos em lados opostos. Shame on me, eu não sabia de nada disso....

Como já haviamos pesquisado um pouco nos jornais antigos, não nos pegou de surpresa o fato de que as ruas da Cidade Baixa eram circundadas pelo Arroio Dilúvio, que anos mais tarde teve o seu curso alterado. A cidade era chamada de Baixa porque era assim que era vista pelos que ficavam nos altos da Duque de Caxias, no centro da cidade. Lá embaixo era zona de negros e italianos, blocos de carnaval, centros de religião. Lá ficava também a chácara de Lopo Gonçalves.
É tão esquisito quando o nome de uma rua se transforma numa pessoa de carne e osso, ou melhor, numa pessoa que já foi de carne e osso.... De repente, a Lopo vira o homem Lopo, nascido em Portugal, residente, comerciário e político em Porto Alegre, morto em 1872, um século antes do meu nascimento. Lopo Gonçalves, dentre outras mercadorias, vendia escravos. Por isso, a sua casa-chácara tinha uma alcova onde ficavam aqueles que não tinham liberdade... Alcova, palavra que se usa corriqueiramente - segredos de alcova - é um espaço onde não há janelas, portanto, sem luz solar direta. Vivendo, ouvindo e aprendendo coisas que já se julgavam aprendidas.
Também durante a caminhada, visitamos a Travessa dos Venezianos, tombada como patrimônio histórico, atitude que deveria ser tomada em relação a outros trechos de ruas e avenidas, que ficam a mercê da especulação imobiliária se não tiverem a devida e necessária proteção.

Last but not least, como bem pontuou o nosso guia arquiteto, conhecer uma cidade é também reconhecer a sua arquitetura e lutar pela sua preservação. Os espigões que arranham os horizontes da Cidade Baixa demonstram o descaso do Plano Diretor para com a história que nos cerca. Mas pensando bem, esse descaso não é só por parte das autoridades políticas... A sociedade civil muito pouco faz, pouco curiosa é, falta indignação e mobilização. Na verdade, falta algo que vem antes disso tudo que citei: falta conhecimento, pois sem ele não se sabe porque se está lutando.

obs. fotos de rodrigo shalako

Um comentário:

Unknown disse...

Que bárbaro essa experiência Nanda! I love it!

Olha só, tem um mimo para você lá no Mosaicos do Sul... espero que goste!

Kisses,

Claudia