domingo, 28 de fevereiro de 2010

Da série: Poemas de Março I - Hilda Hist

"Lembra-te que há um querer doloroso
 E de fastio a quem chamam de amor.
 E outro de tulipas e espelhos
 Licencioso, indigno, a que chamam desejo.
 Não caminhar um descaminho, arrastar-se
 Em direção aos ventos, aos açoites
 E um único extraordinário turbilhão.
 Por que me queres sempre nos espelhos
 Naquele descaminhar, no pó dos impossíveis
 Se só me quero viva nas tuas veias?"

Antologia: Do Desejo
Hilda Hist

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Arroio Dilúvio - Fotos do Cotidiano

Todo dia que vou trabalhar atravesso a pequena ponte que me leva para o outro lado da Avenida Ipiranga em Porto Alegre. 
Sob a ponte, o Arroio Dilúvio, assim chamado porque em dias de chuva forte costumava inundar os bairros vizinhos na década de 50, quando ainda tinha águas limpas. Díficil imaginar. Hoje em dia recebe 50 mil metros cúbicos de resíduos e serve de esgoto para três bairros. Tem de tudo ali dentro, até cadáver de cavalo boiando eu já vi. Em dia de temporal há correnteza forte, ele enche, mas nunca vi ultrapassar a sua borda. Embaixo de suas pontes vivem moradores de rua. 
A espuma suja. A poluição é tão evidente que infelizmente a gente acostuma. 
Todo dia eu atravesso a ponte e tento imaginar águas límpidas...



 





 



 
fotos: Fernanda Stein

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Invictus: Reconciliação e Inspiração

Há eventos históricos que lemos nos livros. Há outros que vivenciamos e que um dia contaremos aos netos. Esses momentos deixam marcas na memória. Sou capaz de lembrar como se fosse ontem o dia em que assisti na TV Mandela saindo da prisão, depois de 27 anos de confinamento na África do Sul. Era fevereiro de 1990 e eu estava na casa de minha vó Wanda em Florianópolis de férias.
Quatro anos depois, abril de 1994, em meio a um grupo de animados sul-africanos, eu participava de um churrasco no terraço da International House em Nova York em celebração à eleição de Nelson Mandela como presidente de seu país. Fiquei contaminada pelo entusiasmo daquele povo oprimido por tantos e tantos anos e emocionada em ver tanto os brancos e negros sul-africanos dançando juntos no território neutro da Big Apple.

Para fugir do calor abrasante de Porto Alegre fui ao cinema ver "Invictus", com direção de Clint Eastwood e com Morgan Freeman interpretando Nelson Mandela.
Em ano de Copa do Mundo de futebol pela primeira vez em continente africano, parece bastante propício falar de esporte e narrar um evento desconhecido por grande parte das pessoas: a Copa do Mundo de Rugby na África do Sul em 1995. Nós brasileiros não temos contato algum com esse esporte que é mania nacional em vários países: Austrália, Nova Zelandia e na própria Africa do Sul, onde o time leva o nome de "Springboks" e tem as cores verde e dourado.
Pois bem, Nelson Mandela, recém empossado presidente, tem nas mãos a dificil tarefa de conduzir um país dividido não só racialmente como também economicamente. Ao invés de promover uma política de revanche com os brancos outrora opressores e que o mantiveram preso por quase 30 anos, ele propõe uma política de "reconciliação", onde a África do Sul é um país para brancos e negros. No esporte ele enxerga a possibilidade de começar a juntar os cacos de uma nação destruída pelo Apartheid.

Mandela é para mim o símbolo de um grande homem, talvez a personalidade pública viva que eu mais admire. Assim como Gandhi ele liderou seu povo às mudanças usando o caminho da paz. 
Mais do que uma lenda viva, um ídolo, Nelson Mandela é uma inspiração.
No filme ele entrega ao capitão do time de rugby um poema que diz ter sido sua inspiração durante os anos de prisão. Fui atrás desse poema com a esperança de que também a mim ele dê forças quando o dia parece perdido. Pois todos temos o nosso Apartheid pessoal e cotidiano contra qual lutar, seja ele de que tamanho for.

Out of the night that covers me,
Black as the pit from pole to pole,
I thank whatever gods may be
For my unconquerable soul.

In the fell clutch of circumstance
I have not winced nor cried aloud.
Under the bludgeonings of chance
My head is bloody, but unbowed.

Beyond this place of wrath and tears
Looms but the Horror of the shade,
And yet the menace of the years
Finds and shall find me unafraid.

It matters not how strait the gate,
How charged with punishments the scroll,
I am the master of my fate:
I am the captain of my soul.


by William Ernest Henley